domingo, 11 de setembro de 2016


O SER HUMANO ALIENADO


Continuo a afirmar que todo o problema do mundo é responsabilidade do ser humano. Ser alienado e separado de sua essência. Não há como arrumar outro responsável. Deus não tem culpa, nem tão pouco o diabo. Como muitos rebatem tal afirmação, e se incomodam quando sou categórica em afirmar que o ser humano é um ser mau, segue um texto teológico para os que se interessarem. Acredito que será bem esclarecedor.

O relato da criação no Livro dos Gênesis, capítulo 1 e 2, descrevem uma série de eventos. A partir do nada cria Deus céus e terra, pois o poder criador de Deus não pressupõe pré-existências, ele traz a existência o que não existe, nele está o princípio de todas as coisas. Mas, o que gostaria de dar enfoque aqui não é o poder criador de Deus, mas sua criação. No desenvolver do capítulo 1 Deus cria, sucessivamente, todas as coisas e vê que tudo era bom. Sua criação chega ao ápice no sexto dia, dia este que, Deus cria os animais, tanto selvagens, quanto domésticos e, também, cria o ser humano (Adam), que no hebraico significa humanidade.
Deus não precisava criar o homem, mas o criou para sua própria glória. Deus não precisa nem de nós, tampouco, do restante da criação para nada; porém nós e o restante da criação o glorificamos e lhe damos glória. Ele nos criou para sua própria glória. Podemos concluir que, o propósito de nossa vida deve ser cumprir a meta para a qual Deus nos criou: glorificá-lo.
De todas as coisas que Deus criou, apenas o ser humano, foi criado à sua imagem e semelhança; as palavras usadas no hebraico são “imagem” (tselem) e semelhança (demût), essas palavras se referem a algo que foi criado de forma similar, mas não idêntico, isso é, uma imagem usada para representar outra coisa, nesse caso Deus. 
É incrível que o único ser criado à imagem e semelhança de Deus é o único que não o glorifica. A Bíblia diz que toda a natureza reflete a glória de Deus e o glorifica. O Ser humano, ao contrário, se afastou de Deus. "Os céus declaram a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos". Salmo 19.1 O único ser criado com a finalidade de representá-lo, cuidando e amando toda a criação destrói tudo o que Deus criou, porque se alienou do seu criador. Ao contrário do restante de toda criação que vive na dependência do criador, o ser humano decidiu ser autossuficiente.
Para os primeiros leitores de Gênesis as palavras imagem e semelhança eram bem claras “façamos o homem à nossa imagem e semelhança”, significava simplesmente: “façamos o ser humano (Adam) como nós, para que nos represente”.
As Escrituras não precisam dizer que, pelo fato de o ser humano ser a imagem de Deus, ele possui capacidade intelectual, pureza moral, natureza espiritual, criatividade, capacidade de tomar decisões éticas, etc. Tal explicação é desnecessária, não só porque os termos tinham significado claro, mas porque nenhuma lista faria justiça ao tema. O texto afirma que, o ser humano é semelhante a Deus e o restante das escrituras fornecem outros detalhes que explicam esse ponto. Ou seja, uma compreensão plena da semelhança do ser humano e Deus, exige uma plena compreensão de quem é Deus no seu ser e nos seus atos, e de quem é o ser humano (Adam) e o que faz.
Mas afinal quem é Deus, e quem é o ser humano?
Primeira coisa que precisamos saber é que, neste mundo alienado, ou pecador, se assim você preferir, Deus precisa possibilitar que nos convençamos de sua existência, senão jamais creríamos nele. Nesse mundo alienado a sabedoria humana é deficiente para que venhamos a conhecer a Deus, assim a pregação vem “em demonstração do Espírito e de poder, para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria humana, e sim no poder de Deus” (1Co 2.4-5). Dependemos do próprio Deus para remover a cegueira e a irracionalidade provocada pelo pecado, pela queda, pela alienação. Portanto, se pretendemos conhecer a Deus, antes é necessário que ele se revele a nós. O Apóstolo Paulo diz que o que podemos conhecer sobre Deus está claro às pessoas “porque Deus lhes manifestou” (Rm 1.19). A criação revela Deus porque ele mesmo decide revelar-se assim. Quando falamos de conhecimento pessoal de Deus, que vem pela salvação, fica ainda mais explícito essa ideia. Disse Jesus: “Ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar" (Mt.11.27). Concluímos que, o primeiro passo para a salvação do ser humano alienado é o conhecimento de Deus.
Deus é infinito, nós somos finitos e limitados, jamais o compreenderemos plenamente. Paulo afirma em (1Co 2.10-12) “as coisas de Deus ninguém as conhece, senão o Espírito de Deus”. Embora não possamos conhecer Deus em sua totalidade, podemos conhecer coisas verdadeiras sobre ele. Deus é amor (1Jo 4.8), Deus é luz (1 Jo 1.5), Deus é espírito (Jo 4.24) Deus é justo e reto (Rm 3.26) etc. Saber essas coisas, não implica que saibamos tudo sobre seu amor, sua justiça ou sobre qualquer outro atributo.
Existem atributos incomunicáveis de Deus, aqueles que ele não partilha conosco, por exemplo, sua eternidade (ele existe desde a eternidade, nós não), sua imutabilidade (Deus não muda, mas nós sim), sua onipresença (Deus está presente em todos os lugares, mas nós só nós fazemos presentes em um único lugar por vez). Outros atributos são comunicáveis, ou melhor seria dizer que são partilhados conosco. Por exemplo, o amor (Deus é amor e nós somos capazes de amar), o conhecimento (Deus tem conhecimento, e nós também somos capazes de alcançar conhecimento), a misericórdia (Deus é misericordioso, e nós também somos capazes de demonstrar misericórdia) e a justiça (Deus é justo e nós também podemos ser justos). Fica evidente que somos representantes, imagem de Deus, pois só podemos possuir os atributos de Deus em parte, exemplo: Deus é sábio e nós podemos ser sábios, mas nunca seremos plenamente sábios. Participamos parcialmente do conhecimento de Deus, mas nunca plenamente dele, pois, “os pensamentos de Deus são mais elevados que os nossos” (Is 55.9). Podemos imitar o amor de Deus, mas jamais seremos infinitamente amorosos como Deus.
Então suscita a grande pergunta: Mas é possível conceber que o homem, mesmo depois de pecar, ainda seja imagem e semelhança de Deus? O homem ainda é imagem de Deus! Sua pureza moral se perdeu, seu caráter foi corrompido, pela falsidade e pelo engano; suas palavras não mais glorificam a Deus; seus relacionamentos muitas vezes são controlados pelo egoísmo, já não pelo amor. Ou seja, Deus fez o homem reto, mas ele se meteu em muitas astúcias (Ec 7.29). Portanto, é importante compreender o pleno significado da imagem de Deus, não pelo que o homem é, se tornou ou como vive, mas pelas indicações bíblicas de quem Deus é. A verdadeira natureza do homem à imagem divina se revelou na vida terrena de Cristo e essa plena medida da excelência da nossa humanidade só será restaurada na volta de Cristo, quando recebermos todos os benefícios da salvação que ele conquistou por nós. Ou seja, o que deveríamos ser, enquanto seres humanos, é tudo que Jesus foi. Ele não pecou!
O estado da existência humana é o estado da alienação. O teólogo Paul Tillich escreve que, o ser humano se acha alienado do fundamento do seu ser, dos outros seres e de si mesmo. O ser humano, tal qual existe, não é aquilo que é em sua essência e o que deveria ser. A alienação está implícita nos símbolos da expulsão do paraíso, na hostilidade entre o ser humano e a natureza, na hostilidade de irmão contra irmão, na alienação de uma nação em relação a outra. A alienação está implícita na afirmação do Apóstolo Paulo quando diz que, o ser humano perverteu a imagem de Deus convertendo-a em ídolos; está em sua visão de hostilidade contra outro ser humano em combinação com seus desejos distorcidos. Contudo, segundo os grandes teólogos alienação não pode substituir pecado. Paulo sempre fala de “pecado” no singular e sem artigo, para Paulo “pecado” é um poder quase-pessoal que rege este mundo. Pecado possui uma conotação que a palavra alienação não possui, pois é um ato pessoal de se afastar daquilo a que se pertence. Ele expressa o caráter pessoal da alienação e expressa a liberdade e a culpa pessoal em contraste com o destino universal da alienação. O pecado aponta para um elemento de responsabilidade, liberdade e culpa pessoal na própria alienação. Segundo Paul Tillich a condição humana é de alienação, mas essa alienação é pecado.
Se usamos a palavras “pecados” isso se refere a atos específicos, que nada mais é que expressões do “pecado”. Não é uma questão de desobediência à lei, mas o fato de o pecado ser uma expressão da alienação do ser humano em relação a Deus, com relação aos outros seres humanos, com relação a si mesmo, com relação à natureza. Pecado é tudo aquilo que não provém da fé, tudo que não provém da unidade com Deus. O ser humano em seu auto realizar-se afasta-se de Deus, volta-se para si mesmo, para seu mundo, perdendo o fundamento de seu ser, e sua representatividade. Aquilo que ele deveria representar, não é mais aquilo que ele representa.
A união do alienado com Deus só se torna possível através da reconciliação, que é restabelecida pelo poder da graça, que opera através da fé em Cristo Jesus. Essa reconciliação não nos livra da alienação, tão pouco do pecado, mas nos possibilita a condução pelo Espírito que, opera em nós tanto o querer quanto o realizar.
A Bíblia diz que: “O salário do pecado é a morte” (Rm.6.23), isso significa que todos pecaram e todos estão sujeitos à ira de Deus e à punição eterna. Isso implica que a justiça de Deus requer uma eterna separação entre o ser humano e ele, impedindo-o de experimentar qualquer benefício de sua parte, e recebendo eternamente sua ira. Para que a justiça de Deus fosse outorgada e sua ira fosse aplacada, seu Filho, Jesus, sofreu e levou sobre si toda a ira e a justiça que o Pai infringiria à humanidade, para que através do sacrifício do Filho a humanidade se reconciliasse com o Pai. Nós não somos capazes de nos apresentarmos diante do Pai, sem o Filho. O único acesso ao Pai é através de seu Filho, Jesus. Não há nada que possamos fazer para que tenhamos acesso ao Pai, por mérito próprio. Toda boa dádiva é dada por Deus. Não há um bom sequer, nem um capaz de fazer o bem sem a atuação do Espírito Santo, que opera através da graça comum a toda a humanidade. Ela é comum porque seus benefícios se estendem a todos os seres humanos sem distinção. Ela é graça porque é concedida por Deus em sua soberania. É essa graça que mantém as coisas funcionando, e é por causa dessa graça que o mundo não entra em colapso. Sem ela aniquilaríamos uns aos outros e tudo à nossa volta. Portanto, não é por nós, nada vem de nós, se dos céus não nos fosse dado. Mas, há uma outra graça, a graça salvífica.  É o favor imerecido (charis), concedido a todos aqueles que aceitam Jesus Cristo como único e suficiente Salvador, é irresistível porque alcança quem o Senhor pretende alcançar, é soberania de Deus. Por essa somos salvos, mediante a fé em Jesus Cristo.
O Apóstolo Paulo escreveu: “Porque bem sabemos que a lei é espiritual; mas eu sou carnal, vendido sob o pecado. Porque o que faço não o aprovo; pois o que quero isso não faço, mas o que aborreço isso faço. E, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa. De maneira que agora já não sou eu que faço isto, mas o pecado que habita em mim. Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e com efeito o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem. Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero esse faço. Ora, se eu faço o que não quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em mim. Acho então esta lei em mim, que, quando quero fazer o bem, o mal está comigo. Porque, segundo o homem interior, tenho prazer na lei de Deus; Mas vejo nos meus membros outra lei, que batalha contra a lei do meu entendimento, e me prende debaixo da lei do pecado que está nos meus membros. Miserável homem que eu sou! Quem me livrará do corpo desta morte? Dou graças a Deus por Jesus Cristo nosso Senhor. Assim, que eu mesmo com o entendimento sirvo à lei de Deus, mas com a carne à lei do pecado”. (Rm.7.14-25)
Quando Jesus foi interpelado pelo jovem rico dizendo: Bom Mestre, que bem farei para conseguir a vida eterna? (Mt 19:16) Jesus o repreendeu dizendo: Porque me chamas bom? Há um só que é bom, e esse é meu Pai que está nos céus. Se você faz o bem para alguém, se está agindo com bondade, pode ter certeza que Deus em algum momento está trabalhando de uma forma especial em sua vida. Não pense que isso sai de si mesmo, que você é bom, que é uma pessoa boa. A Bíblia diz que o homem é mau desde o ventre de sua mãe. Não somos bons. Podemos fazer coisas boas, às vezes, e até viver uma vida com aspectos de bondade, mas isso não nos faz sermos bons. Apenas mostra que podemos ser usados por Deus para fazer alguma bondade. Mas Deus é bom. Ele poderia virar as costas para você e continuaria sendo Deus. Poderia abandonar toda a sua obra de criação e continuaria sendo Deus. Ele não precisa de nós para ser Deus. Ele sempre foi, sempre é e sempre será. Mas, nós sem ele nada somos.
Concluo com as palavras de Paulo aos Filipenses 2.5-15
"De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve em Cristo Jesus, que sendo em forma de Deus, não teve a usurpação de ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até a morte, e morte de cruz. por isso, também Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu um nome que é sobre todo nome; para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai. De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor; porque Deus é o que opera em vós tanto o querer quanto o efetuar, segundo a sua boa vontade. fazei todas as coisas sem murmurações nem contendas".

Que Deus nos abençoe!

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