sexta-feira, 23 de setembro de 2016

O VERDADEIRO SIGNIFICADO DE JUSTIÇA SOCIAL
Resultado de imagem para justiça Social
Minha monografia de conclusão de curso teve como tema “A justiça Social a partir da Teologia Wesleyana da Nova Criação”. Durante vários meses me debrucei sobre pilhas de artigos, páginas e páginas de livros a respeito do assunto. Sem a intenção de esgotar o assunto e com muita humildade, gostaria de compartilhar algumas nuances do que vem a ser justiça social, numa perpectiva bíblica e cristã.
Apesar de ter estado durante, praticamente, toda minha vida dentro de uma Igreja Metodista, ter aprendido desde cedo toda doutrina baseada na doutrina wesleyana, e ter tido uma educação cristã metodista, nunca tive John Wesley como ídolo, mas sim como exemplo. Creio que tudo o que é bom, o que deu certo, o que é puro e reto deva ser imitado. O Apóstolo Paulo disse: ‘Sede meus imitadores, assim como sou de Cristo”. Por isso, depois de aprofundar-me nos estudos a respeito da Teologia de John Wesley, estudar sobre sua vida e ministério, e sobre tudo aquilo que ele desempenhou durante sua jornada ministerial, entendi que ali estava um exemplo claro do verdadeiro significado de “Justiça Social”, tema tão proclamado e aclamado nos dias atuais, mas percebo, muito pouco entendido. Claro que, também entendo que muitos, no ávido desejo de justiça, cometam equívocos em suas teorias por falta de conhecimento do verdadeiro significado de justiça social nos evangelhos. Por esse motivo, decidi escrever esse texto, a partir de um embasamento teológico e de pesquisa acadêmica. O texto trás partes de minha monografia, sem nenhum tipo de ideologia, para que aqueles que detêm esse ávido e nobre desejo de justiça, não vivam equivocados, ou, pelo menos, que se deem ao benefício da dúvida e possam aprender um pouco mais, sobre o verdadeiro significado de justiça social, segundo o Evangelho de Jesus Cristo
Não podemos negar nossa herança histórica, pois o que fazemos e pensamos é, em parte, resultado de todo legado que recebemos. O fato de buscarmos na tradição exemplos a serem empregados nos nossos dias, não nos faz, necessariamente, cerrar os olhos para nossa realidade contemporânea, nem nos exime de criticarmos o que já foi feito. Não se trata de reproduzir algo como sendo uma realidade imutável, mas construir o novo a partir de experiências vividas e já construídas, nas quais a nossa participação, em uma construção contemporânea, é igualmente requerida.
O relacionamento entre o ser humano e Deus cria a concepção na humanidade de como atuar no mundo, gerando uma insatisfação com o modo como se vive. Consequentemente, por essa insatisfação, o ser humano é levado a viver em fraternidade e comunhão. A partir disso, dependendo da inspiração na relação “homem-Deus” o ser humano ou se torna um agente transformador ou um simples elemento passivo frente às mazelas vividas.
A teologia cristã se desenvolveu a partir do conceito de um Deus Criador, que se revelou encarnado em Cristo como manifestação plena de sua doutrina e prática.  Tal revelação conclama a todos os seres humanos a viverem em harmonia e equilíbrio com toda a criação, levando-os a participar de uma missão da esperança, na qual os ideais de salvação são vivenciados no ministério do amor.   “E andai em amor, como também Cristo nos amou, e se entregou a si mesmo por nós, como oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave” (Ef.5.2). Toda missão e justiça social precisa ser compreendida a partir da criação de Deus. A ação de Deus transforma, gera uma nova Vida, uma nova criação em Cristo, trazendo justiça.
O século XX foi um período marcado pelos inúmeros avanços tecnológicos, conquistas e revoluções. Mudanças sociais, culturais e políticas aconteceram em uma velocidade nunca experimentada antes. A humanidade foi, de maneira inigualável, impactada por seus atos e consequências. Mudanças profundas nas relações de trabalho tiveram implicações marcantes sobre a sociedade humana.
Diante deste contexto a América Latina, continente marcado por dominação, exploração e espoliação, também passou por um momento de consciência social crescente e busca de um processo libertador histórico, o que levou na área da Teologia a uma reflexão teológica latino-americana, que assumisse uma nova compreensão da história e do papel teológico nela.
O eixo hermenêutico central dessa nova teologia é convidar a Igreja a ver e repensar a missão a partir dos pobres, identificando-se com eles e dando a eles vez e voz.  A opção preferencial pelos pobres, na Teologia Latino-americana, deve ser compreendida levando-se em conta a misericórdia de Deus. Entendemos que: “Não oprimirás o trabalhador pobre e necessitado, seja ele de teus irmãos, ou seja dos estrangeiros que estão na tua terra e dentro das tuas portas” Dt. 24.14.
A história do cristianismo latino-americano é repleta de contradições, desdobramentos e desafios. O cristianismo foi pregado e imposto a uma diversidade de povos. Os africanos trouxeram com eles suas tradições religiosas; os imigrantes e missionários protestantes a cultura branca europeia, que visava civilizar um povo incivilizado; com a missão americana, a herança religiosa pietista, evangélica, centrada na salvação em Jesus Cristo, na busca da santidade, na direção do Espírito Santo, que tem como alvo a experiência individual de conversão de crescimento na fé.
Deus é um Deus libertador e a Bíblia relata a luta do ser humano contra a opressão. Portanto, uma teologia que liberta deve lutar por transformar o mundo em uma sociedade mais justa. Para Wesley a renovação da criação e das criaturas mediante a renovação da imagem de Deus na humanidade é a essência do cristianismo. Wesley reconhece que a criação original, como é descrita nos relatos bíblicos, não é questão de razão ou experiência, mas de revelação divina. Distanciamos hoje daquilo para o qual originalmente fomos criados; o pecado se interpõe entre nós e nossa condição original. No entanto, Wesley está convencido, a partir das fontes bíblicas, tanto no que se refere à criação, quanto às profecias do cumprimento do que está por vir, de que podemos chegar a um entendimento do propósito divino na criação original.
Na pregação do Sermão de número vinte e seis “Sobre o Sermão do Monte” de Wesley, o pedido feito na Oração do Pai Nosso “venha a nós o teu reino, seja feita a tua vontade assim na terra como no céu” antecipa o cumprimento da criação,
Quando, pois, pedimos que a vontade de Deus “seja feita, assim na terra como no céu”, este pedido significa que todos os habitantes da terra, de todas as raças da humanidade, possam fazer a vontade de seu Pai que está nos céus tão voluntariamente como os santos anjos; que façam continuamente, como os anjos, sem abrir qualquer hiato no serviço diligente; que a façam perfeitamente, para que “o Deus de paz pelo sangue do eterno pacto, os aperfeiçoe em todo o bem, para que façam a sua vontade, e neles opere” tudo que “seja agradável a seus olhos”. (WESLEY, 1953, p.557)
Wesley prevê o futuro divinamente operando com o presente, essa visão do alvo apreendida não apenas das promessas divinas, mas nos sinais de renovação que já se manifestam na vida dos crentes e por meio dela, para Wesley apontam para o propósito de Deus na criação. O ser humano foi dotado de sentido, entendimento e também de vontade, possui liberdade e poder de conduzir seus próprios sentimentos e ações, e capacidade de determinar a si mesmo, de escolher o bem ou o mal. Caso o ser humano não tivesse recebido essa liberdade não seria capaz de buscar a santidade ou qualquer tipo de virtude. A tragédia humana foi ter feito mau uso dessa liberdade, revoltando-se contra o seu criador, distorcendo o relacionamento para o qual foi criado. Ao se rebelar alienou-se de si, do outro e de Deus, herdou o pecado, lançando tanto a si mesmo, e também toda a criação na desordem, sofrimento e morte. O pecado original é um acontecimento histórico de consequências de longo alcance. A criatura que recebeu liberdade para estar em relação positiva com o Criador usou-a para se afastar e construir um mundo autossuficiente.
No pensamento de John Wesley a graça abundante sobre a terra seria muito maior que o pecado. A perda da imagem original de Deus seria suplantada pela possibilidade de uma nova, restaurada pela graça. Pois “assim como em Adão todos morreram, assim todos serão vivificados em Cristo”. Deus revelou seu amor à humanidade através do Seu Filho Jesus, entregando-se por ela, a fim de que o Espírito de Deus renovasse a sua imagem nos nossos corações. “A renovação da criação se dá através da renovação da imago Dei na humanidade qual a humanidade foi criada: viver a imagem de Deus no mundo”.
Na compreensão de John Wesley a imagem de Deus está relacionada, não tanto ao que o ser humano possui, mas ao modo como ele se relaciona com Deus e como vive essa elação com tudo à sua volta. Ele descreve o ser humano como aquele que recebe o amor de Deus e então o reflete no mundo, não como capacidade ou posse, mas como relacionamento vivo propiciado pela graça divina que o mantêm ativo. O ser humano precisa receber de Deus, constantemente aquilo que transmite. Essa imagem de Deus é uma vocação, para a qual o ser humano é chamado e na qual está o seu próprio destino. Essa imagem reside não tanto na criatura, mas no modo como essa criatura vive sua relação com o seu Criador, usando os dons e a capacidade que recebeu para comunhão com a sua fonte de modo a refleti-la no mundo.
O pensamento wesleyano é motivado por situações vividas, tanto pessoais como coletivas. Sua teologia fundamenta-se na própria vida, na relação com Deus e nas relações interpessoais. Pode-se dizer que a teologia de Wesley está baseada no caminho da salvação, como uma forma prática de conduzir o homem na vida cristã, de forma a mobilizar um avivamento pessoal e coletivo. O Espírito de Deus que opera em nós nos compele a colocar-nos a serviço do nosso próximo. No sermão “O Cristianismo bíblico”, Wesley fala da transformação que ocorre na pessoa que se converte. Não uma mudança religiosa, mas um voltar-se para Deus, a partir da ação do Espírito Santo em nosso ser. Essa ação desperta no crente, um profundo amor pelo seu Senhor e consequentemente o move em direção ao outro. Para Wesley viver o cristianismo é viver uma religião social, é fazer como o Senhor fez, é amar como Ele nos amou e nos acolheu, amando e acolhendo o próximo.
A verdadeira imagem de Deus, que deveríamos ser, só pode ser restabelecida através da reconstrução do laço entre criatura e criador, entre a imagem e sua fonte. Para que a humanidade se torne diferente do que é hoje, em suas tentativas ávidas e gananciosas de produzir a própria segurança, são necessários recursos transcendentais, parceria e participação no Espírito Divino. Mas, a humanidade não pode por si mesma, retomar esse relacionamento, a iniciativa vem do próprio Criador e ela se chama graça. A graça segundo Wesley é fundamentada no amor de Deus pela humanidade manifestada em Cristo. Essa graça comunica o perdão e manifesta renovação. A reconstrução desse laço capacita o ser humano a partilhar a natureza de Deus.
A graça se manifesta de três maneiras: em nossa criação, no perdão e em nossa recriação. Para Wesley a natureza da graça é o amor, ela não pode ser imposta, nem “irresistível”, no entanto, ela auxilia a resposta humana. Esse auxílio são as sugestões do Espírito de Deus, que comunica a graça e inicia o processo de renovação. Para Wesley primeiro nos arrependemos para depois crermos no evangelho. Devemos romper com a dependência de nós mesmos antes que possamos depender de Cristo. Cristo nos possibilita a justificação, nos realinhando e nos restaurando ao relacionamento para o qual fomos criados. A justificação dá início ao processo de restauração da imagem de Deus em nós, que será concluído, segundo Wesley, pela santificação, que consiste no poder do Espírito Santo atuando dentro de nós de forma a renovar toda nossa vida. Essa transformação constitui a santidade. A passagem paulina preferida de Wesley era: “Desenvolvei a vossa salvação com temor e tremor, porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade” (Fl.2:12-13). Para que nossas obras sejam boas, elas precisam resultar dessa colaboração na qual Deus é um parceiro, e pelo Espírito coprodutor das obras. O Espírito de Deus habita a criatura, e como consequência as obras que ela produz devem expressar a vontade divina e humana em ação conjunta.
Wesley em seu sermão acerca das riquezas sinalizou alguns perigos, mas principalmente o fato de que na acumulação de riquezas, o que mais destrói tanto a vida cristã como a vida civil, é o dano que é feito a quem não tem riquezas. Wesley explica porque em uma terra que “mana leite e mel”, há milhares de pessoas que padecem de fome. Segundo ele a razão é que existe um mau uso dos recursos nacionais, por pessoas poderosas, e que ainda se chamam cristãs. A Inglaterra dos tempos de Wesley vivia esse cenário, os recursos eram usados com finalidades fúteis e desnecessárias, como na produção de bebidas alcoólicas e alimentos para cavalos que puxavam as carruagens e charretes dos nobres. Havia monopólios dos bens de primeira necessidade, o que encarecia os produtos. A Inglaterra passava de uma economia agrícola-medieval para uma economia industrial. Wesley viajava por todo o país e testemunhara as condições de desemprego e pobreza em toda parte.  Em seu sermão de número cinquenta, Wesley escreve que,
Porque seja o mundo tão corrupto quanto quiser, o ouro e a prata são culpados? “O amor ao dinheiro”, sabemo-lo, “é a raiz de todos os males”; mas não ao dinheiro em si. O mal não está no dinheiro, mas nos que usam dele. Ele pode ser usado para o mal: e que há que o não possa?  Mas pode igualmente ser usado para o bem: é suscetível de ser aplicado para o melhor fim, assim como para o pior. (1953, p.479)
A fala de Wesley orienta a igreja a usar os recursos que ela possui para um fim proveitoso, para o bem social libertador e não para o bem de si mesma. E também, para que a igreja seja aquela que instrua os seus a agirem da mesma forma. Liberdade para Wesley é o compartilhar da graça recebida a fim de que a atuação do Espírito Santo, que opera no crente, traga uma nova ordem social e econômica. O conhecimento abstrato da sua situação não basta; a vivência direta da sua condição é um pré-requisito para o entendimento.  Muito antes de a igreja descobrir a “opção preferencial pelos pobres”, Wesley já a praticava. Ele visitava os pobres, estava no meio deles, compartilhava de suas lutas e dores.
O que Wesley oferecia a eles, era mais que a assistência material, ele apresentava uma comunidade que buscava recebê-los e afirmar-lhes o valor que possuíam diante de Deus. A esses miseráveis os metodistas levavam um sentimento de valor próprio. Aos que haviam sido desalojados de suas aldeias rurais pelas leis de monopolização das propriedades e que se encontravam perdidos nas cidades hostis, os metodistas ofereciam uma nova comunidade de cuidado mútuo. Wesley levou aos pobres não apenas um sentimento de valor próprio, mas uma sensação de poder sobre o próprio destino. Ao serem renovados à imagem de Deus, eles estavam recebendo poder para viver essa imagem, estavam sendo chamados a serem cooperadores de Deus para estender os benefícios da graça que receberam a todos com quem se encontrassem.
Wesley organizava e treinava pessoas em atividades organizacionais. Os que se identificavam com o metodismo eram organizados em sociedades, e as sociedades em classes e bands, e os que possuíam habilidades tornavam-se pregadores e líderes leigos. À liderança exigia capacidade de ler e escrever, e assim surgiram as escolas para ensinar as pessoas a ler as escrituras, isso muito antes do surgimento das escolas dominicais. Ser capaz de ler as Escrituras representava estar diretamente em contato com o poder libertador sem a necessidade de uma autoridade mediadora, um clérigo ou pessoa de estudo. Essa organização mostrou-se ser uma semeadora para o cultivo da liderança, da administração e da assistência mútua.
A preocupação de Wesley com os pobres e desempregados resultou em indústrias caseiras, e venda de produtos entre os metodistas. Os serviços de saúde eram indisponíveis aos pobres, eles não podiam pagar nem os remédios, nem os médicos, assim Wesley levou adiante o interesse e estudo de medicina em Oxford, e em 1745 ele publicou o tratado médico, uma coleção de receitas para o uso do pobre, recomendava tratamentos simples para sessenta e três, enfermidades. Em 1747 publicou um livro de autoajuda com diagnósticos e remédios, um método fácil e natural de curar diversas doenças. Quando Wesley conseguia a colaboração de médicos e boticários, montava clínicas e dispensários para atende a todos. Diversos médicos, incluindo alguns membros da Sociedade Real de Médicos, se apresentaram como voluntários para atender nos serviços de saúde metodista para os pobres. Essa crescente rede de relacionamentos sociais e interdependência significaram muito na vida do proletariado, dos camponeses e pequenos agricultores, pois eles não eram simplesmente vítimas da sociedade, mas podiam se tornar agentes ativos, livres e com algum grau de controle sobre o próprio destino.
Para que uma Teologia da Nova Criação tenha relevância no contexto social latino americano é necessário que ela esteja centrada em dois pontos fundamentais da teologia wesleyana: a soberania divina e a responsabilidade humana. Se Deus é um Deus que se revela e essa revelação possui valor eterno, é preciso que essa revelação seja expressa no tempo, pois nenhuma teologia pode ser desconectada da vida. Ela deve ser reflexão crítica denunciadora dos desvios desumanizantes da realidade, anunciando os desígnios libertadores de Deus na história. Aquele que foi justificado tem fome e sede de justiça; e é instrumento de justiça na vida do outro, disponibilizando seus dons e recursos em ajuda mútua.
A igreja primitiva alcançava e alimentava os famintos, vestia os nus, auxiliava os órfãos e os peregrinos, visitava e ajudava os enfermos e encarcerados, todos os seus bens eram usados para sustento dos pobres e necessitados. Era uma graça recebida e compartilhada. Para Wesley o poder e a presença do Espírito Santo traz uma nova ordem social e econômica. Portanto, justiça social é viver esse mesmo espírito, a prática da partilha. Para o Novo testamento, todas as funções existentes na comunidade contêm este caráter: estar a serviço, em obediência a quem serviu primeiro. A justiça social que tem Jesus Cristo como fundamento precisa necessariamente ser prática, pois ela resulta do seguimento da sua cruz. A fé cristã não se limita à contemplação, mas em se envolver com Jesus, ela precisa ser uma teologia da práxis, na prática e para a prática. 
Para Wesley, Deus dotou o homem com capacidade de liderança e administração para ser “regente sobre a terra”. Essa energia vinda de Deus constitui toda a dinâmica, onde os seres humanos participam desse poder e são incorporados à obra fundamental de restauração da criação, através de suas obras. O foco dirige-se ao mundo, como caminho de salvação que enfatizava a graça de Deus e a responsabilidade humana como participante na valorização da vida.  A presença de Deus, é a imagem refletida no ser humano de forma real, ela se evidencia relacionalmente. Somos capacitados, através da atuação do Espírito Santo, a vivermos a relação divino-humana. Deus opera em nós e então podemos operar. No momento em que a graça foi recebida, isso deve resultar em ação, para com os outros para a causa do reino, operando a própria salvação como um cuidado com o outro.
O exercício da imagem de Deus restaurada é um movimento nutrido pela Escritura e pelo amor divino, ele atua através do exercício da razão, da vontade (livre arbítrio), da experiência e de toda a tradição que nos move em direção à santidade cristã que se traduz na prática das boas obras. Esse ser humano “nova criação” é o instrumento de justiça e paz nesse mundo; é agente transformador da história. A ênfase não está somente no estabelecimento de relações transformadas entre a pessoa individual e Deus e outras pessoas, mas visa toda a humanidade. Desta forma devem-se haver esforços para melhoria da saúde do povo, o engajamento em educação, para que a mente seja liberta do cativeiro do engano e da manipulação, como restauração e a busca da perfeição da razão corrompida, e toda ação que vise o bem-estar social. Toda justiça social que não permeie esses valores, não será justiça social de Cristo, ainda que tenha aparência de bem. Toda justiça social que busque benefício próprio, poder e auto realização não será justiça social de Cristo, em Cristo convém que, nós diminuamos para que Ele cresça.
A graça que concede salvação não é vista isolada da pessoa, mas implica o envolvimento da pessoa no seu “interior”, tanto em relação a Deus como ao próximo; e no campo “exterior” ao mesmo tempo em que ela transforma ela é transformada.  A educação é o pilar do processo de restauração racional que faz parte da restauração da santidade.  A educação contribui para a restauração da imagem natural no ser humano, pois a razão nos capacita a compreender, e isso nos possibilita discernir e fazer julgamentos corretos. A santidade e o amor para com Deus e com o próximo iriam se fortalecer mediante uma educação contínua, a qual é importante, tanto para crianças como para adultos, de todos os sexos, raças e classes sociais. Em seu sermão de número noventa e seis sobre a educação de crianças, Wesley afirma:
Como a única finalidade de um médico é restaurar a natureza ao seu estado próprio; então, a única finalidade da educação é restaurar nossa natureza racional ao seu estado apropriado. [...] E, como a medicina pode justamente ser chamada de arte de restaurar a saúde, então, a educação pode ser considerada, sob outro aspecto, como a arte de recuperar, para o homem, a sua perfeição racional. (1783, p.348)
A insatisfação em relação a todo estado das coisas presentes, tanto no âmbito individual como da sociedade, precisa promover uma motivação persistente na busca por reforma do ser humano, de forma que isso influencie tudo à sua volta. A justiça social de Cristo tem seu foco no resgate e na promoção da vida, se a justiça anunciada não promover “vida” ela não será a justiça de Cristo. Justiça social em Cristo é atuar como agente transformador da história, seja em casa, na escola, no trabalho, na igreja e na sociedade como um todo. Não é uma justiça ideológica, mas uma justiça que se move em ações, sejam elas as menores ou de grandes proporções, e que traga alento, libertação e transformação de toda realidade que fira a dignidade humana. Justiça essa fundamentada em amor e misericórdia.
O que temos visto e presenciado nesse tempo em nossa nação, é um discurso falacioso e oportunista que, usa a capa da justiça para fazer-se poder. Usa-se a capa da justiça para benefício próprio; usa-se a capa da justiça para interesses escusos. Em nada essa justiça proclamada, assemelha-se à justiça de Cristo. A justiça de Cristo liberta o oprimido para que esse se torne agente transformador de sua história, e jamais o torna refém do que se diz agente da justiça. A justiça de Cristo ensina a lançar as redes. Oferece educação para que a mente seja transformada, partilha o pão sem interesses, não visa benefício próprio, não usa de engano para angariar adeptos ou fãs. Jesus dizia a verdade mesmo sabendo que por dizê-la seria condenado à cruz.
Não se iluda com belos discursos, ainda que eles venham embalados em um lindo papel de presente, pois o interior pode não ser tão belo quanto a aparência, e, na realidade, o belo papel sirva apenas para esconder as verdadeiras intenções maléficas. Se o que for dito desviar-se uma vírgula do evangelho de Cristo que seja anátema.


Nenhum comentário:

Postar um comentário